Wednesday, November 28, 2007

NEM PERTO NEM LONGE



Se este texto tivesse como título “proximidade e distância” ia associar-se aos títulos que um amigo meu costuma dar às suas exposições e aos textos que escreve. “Perto e longe”, ainda assim é mais isento e distancia-se dos títulos cliché dos produtos e registos da actualidade. A questão é a seguinte: dado um interesse (interessado) genuíno e intenso num campo cultural, que possibilidades teremos de orientar esse nosso interesse de forma a não turvar a visão?

Os interesses, interessados, autênticos e intensíssimos aproximam-se da verdadeira paixão que, por vezes, ultrapassará a sensatez e o bom senso. Ou seja, deixamos de “ver” ou deixamos de saber ver, avaliar e discernir seja lá o que for que se coloque diante de nós, ou, ao qual nós nos aproximamos.

Ontem de tarde, no café de Ceuta, explicava a um (outro) amigo que gosta de boatos, affairs de elevador e casos obscuros, que há efectivamente muitas relações que ficam aquém da “distância do cuspo”! Nem tudo dá para isso, disse-lhe. E realmente, raras são as relações pessoais e objectuais, a essa proximidade. É que, com essa medida de afastamento tão pequeno não se vê nada.

A diferença está entre a perspectiva e a axonometria - uma visão limitada e uma outra ilimitada. Dois exemplos de visão, relação, extremos.

Quem sabe como se opera com estes dois sistemas de representação entenderá o que pretendo explicar. A uma perspectiva corresponde um campo visual relativamente pequeno, e permite-nos abranger 60 graus. Podemo-nos sempre colocar como observadores de modo a conseguir uma imagem mais abrangente e obtemos a tal “big Picture”, como se diz. Mas também podemos nos colocar em frente de uma parede ou outro obstáculo e não ver nada, a não ser a superfície texturada da parede. É uma decisão consciente ou não, de nos colocarmos para ver o particular ou o geral. E assim, conseguimos adquirir mais ou menos profundidade.

Com curiosidade, fazemos uma rotação para ver mais e colamos perspectivas diferentes. No final podemos chegar a uma panorâmica (colagem de 2 ou 3 imagens perspectivadas) ou até a outras imagens deste género, que não distorcendo a realidade (ou seja, sem forçar a que o campo de visão seja maior), apenas ampliam a noção de realidade. Dentro da perspectiva, este exemplo, de colagem é o oposto de olhar para a parede. (exemplo, observador colocado no centro de uma sala, com uma máquina fotográfica, a tirar fotografias até perfazer 360 graus à sua volta, apanhando tudo o que está à frente, aos lados e atrás...aliás estas noções deixam de existir, porque ele está no centro e só há frente, trás e lados à vez e em cada imagem de conquista!

A perspectiva é humana, a axonometria é divina. Diz-se assim, por conveniência, que só alguém muito afastado da realidade terrena poderia ver em axonometria, poderia ver sem distorções e com as linhas paralelas.

Um exemplo mais directo: a perspectiva = a viver numa casa, primeiro estou num quarto, depois na sala, depois no corredor e à passagem de cada divisões recolho imagens parciais dos sítios onde passei; axonometria = a ter a maqueta da casa na mão, numa escala reduzida, estou a ver tudo de uma só vez, quarto, sala, corredor, a imagem resultante é uma e é total.

Segue-se a aplicação disto que foi exposto (senso comum dos sistemas de representação!).
A axonometria está-nos interdita a não ser no faz de conta. Os nossos limites (e o reconhecimento destes), leva-nos a considerar que podemos aldrabar e criar uma ilusão do que não vemos e não experimentamos. A perspectiva só vale se apanharmos alguma coisa.

A aplicação é simples, a conclusão não a tenho. Este fim de semana, para variar não estarei a olhar de dentro para fora, estou em outro sítio a não pensar que existe um dentro e um fora!
Talvez com a distância se passem fenómenos engraçados!

5 comments:

THE WRONG GUY said...

Como sistemas de representação há também o Método Europeu e o Método Americano.

isabel carvalho said...

YA!?

Anonymous said...

sendo que nestes casos 1+1 não é igual a 2, de certa forma um largo conjunto de perspectivas acaba por ser mais rico que uma axonometria.
e sendo o divino uno, acaba por ser bastante parcial. a multiplicidade, apesar de imperfeita, dos que aqui pupulam acaba por ser bastante mais rica e interessante.

enfim- é como os gelados, se comermos cada dia um sabor, primeiro chocolate, depois menta, depois baunilha, morango, etc, o sabor que nos fica no fim não é o entediante tutti-frutti.

isabel carvalho said...

É mesmo por aí.
Eu penso o mesmo.
A axonometria não é possível, está fora de questão, porque não temos essa distância. Não somos neutros, mesmo com muito esforço.
Dentro da perspectiva, acho que vale a pena fazer panoramicas e/ou colar diferentes pontos de vista - muitos e diversos!

À distância do cuspo é que não...

Anonymous said...

cuspo só se for para comer gelados! boa, acho que vou fazer isso... passar o weekend a lamber cones!