Sunday, August 02, 2009

EMISSORES REUNIDOS


Vídeos / Relógio Capital

Aquando da publicação “Relógio Capital”, o vídeo que foi realizado “Relógio Capital: Escola das Gatas”, inaugurou uma série de vídeos que lhe deram continuidade: “Aurora”, “Observadora mede em altura e em largura linhas de tempo”, “Amanhã”, “Padrão Têxtil: Não é preciso ser um Quarto — para estar Assombrado — Nem é preciso ser uma Casa — O Cérebro tem Corredores — que ultrapassam os Lugares Materiais —“ e o “Poço”.

Tendo como referência originária a publicação “Relógio Capital”, estes vídeos são consequência do texto impresso e ilustram o diálogo com o tema tratado – o tempo. O tempo que é retomado como tema, é também explorado enquanto característica própria do suporte vídeo – a sua duração temporal.

1-Em “A escolas das gatas” à mesma hora do dia, durante semanas, foram filmados três gatas à solta num atelier de um artista, apanhadas a brincar com o material espalhado pelo chão ou a dormir. Com este vídeo revela-se, metaforicamente, o prazer no jogo e no aproveitamento da existência em actividades prazenteiras. Contrariando a ideia de um existência apenas direccionada para o trabalho.

2-Em “Aurora” uma jovem vestida e maquilhada de arlequim pratica exercícios básicos de bateria como processo de libertação. Fá-lo através da escolha do instrumento e pela força empregue como também através do deambular entre ritmos, improvisando, alterando constantemente a direcção da sua procura musical. “Aurora” é igualmente homenagem a Nietzsche: o toque dos tambores que anunciam um tempo novo, um novo dia, uma nova moralidade e, enfim, o despertar para uma nova vida e é o titulo de um livro seu datado de 1881. O tempo de “Aurora”.

3-“Observadora mede em altura e em largura linhas de tempo”, surgiu da leitura da biografia de Patrícia Highsmith que possuía viveiros de caracóis para lhes observar o comportamento e sobre os quais escreveu um conto - “O observador de caracóis”- e do conhecimento da prática “desportiva” dos observadores de caracóis e das suas motivações. Os caracóis como animais de lenta locomoção, proporcionam a quem os observa uma desaceleração do ritmo, ou mesmo uma suspensão do tempo real, quotidiano. Assim, os observadores de caracóis exercitam exemplarmente duas importantes actividades: a contemplação e a introspecção.
[Na cidade Deep River, em Ontário, Canadá – referência constante nos filmes de David Lynch - antiga cidade-abrigo de cientistas e técnicos a trabalhar na Central Nuclear de Chalk River Nuclear Research Laboratories esta prática era muito vulgar constituindo-se inclusive uma sociedade ou clube: Society To Watch The Snail Watchers.]

4-Em “Amanhã”, foi filmado um antigo parque infantil construído em pleno Estado Novo, contendo um palco, um anfiteatro, esculturas evocando máscaras de civilizações ancestrais, zigurates e colunas gregas, em betão, compondo uma espécie de parque temático civilizacional. Esta ruína está localizada atrás da Faculdade de Belas Artes e entre a praça da Alegria e o sítio onde se realiza a feira semanal da Vandoma. O vídeo resulta de uma colagem de imagens paradas, que no conjunto fazem um retrato aproximado do sítio. Quer a configuração como estado de destruição em que se encontra e a inactividade (desde há muito os parque infantis de betão estão proibidos) deste parque numa cidade da actualidade, proporciona-lhe uma dimensão irreal e atemporal.
"Amanhã" é também o título de uma publicação anarquista portuguesa datada de 1910. De entre os seus artigos, destacam-se as discussões em torno do amor livre, da pedagogia libertária, do ateísmo, «rompendo com todo o passado, sem respeitar nem ídolos, nem deuses, nem dogmas, nem preocupações». Tanto a revista, os temas abordados, como o registo deste “Amanhã” é representativo de um tempo sem tempo.

5-“O Poço” surge de filmagens realizadas ao anoitecer de uma das antigas entradas para o subterrâneo da Avenida dos Aliados. Enquanto as outras duas foram tapadas, à superfície, por pavimento novo, esta escapou e mantém-se sendo uma entrada para sítio nenhum. A ideia de começar as filmagens surgiu em conversa com um amigo que teve um sonho com esta entrada em funcionamento, da mesma maneira que um amputado sente dor num membro fantasma passados muitos anos sem essa parte de si mesmo. A escadaria da entrada ainda tem utilidade, serve de pequeno atalho entre a Rua 31 de Janeiro e a Estação de S. Bento e tem grande movimento durante o dia - para além de que ainda alberga num patamar da escadaria uma tabacaria com clientela habitual.


6-“Padrão Têxtil: Não é preciso ser um Quarto — para estar Assombrado — Nem é preciso ser uma Casa — O Cérebro tem Corredores — que ultrapassam os Lugares Materiais”
Inicia-se com a filmagem de um vaso contendo uma planta vulgar chamada Morging Glory - nome comum (em língua inglesa) atribuído a esta planta que frequentemente se avista nas bermas de estrada, em terrenos baldios e em jardins que crescem espontaneamente no meio da cidade. É cientifico que o consumo das suas sementes em larga escala produz um efeito alucinatório semelhante ao LSD. Os consumidores afirmam que o intenso efeito pode prolongar-se por mais de 7 horas seguidas.
As filmagens realizadas num ambiente doméstico, num quarto, com o referido vaso em cima de uma cómoda, são alternadas com filmagens de um caleidoscópio de pedras coloridas. No vídeo alternam-se os momentos do vaso e do caleidoscópio durante o tempo necessário para que o observador se interrogue sobre a natureza das imagens e de que forma se podem associar.
Associa-se ainda a ideia de padrão, de matriz que se repete, uma vez que o desenho desta planta foi explorado graficamente durante o período da arte nova e arte deco. Assim, à familiaridade da planta com o observador acrescenta-se o incomodo de a ver sobre uma nova perspectiva – a de uma substância alucinatória.

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